“Há aqui um rapaz com cinco pães de cevada e dois peixes pequenos; mas de que servem no meio de tanta gente?” [João 6:9]
Se você fosse o rapaz forneceria a sua provisão?
Talvez se de antemão tivéssemos a informação que seria multiplicado, muitos de nós ofereceríamos, mas sem a promessa da multiplicação… Não sei não!
Dúvidas a parte, não é raro notícias de que pessoas foram levadas a grandes perdas por promessas de altos ganhos em investimentos financeiros. São várias as modalidades de golpes, inclusive, há pessoas que acreditam que a multiplicação dos pães e peixes é um golpe bíblico, algo que não aconteceu. Será?? Não podemos negar que é algo extraordinário, por isso é um milagre.
Também é extraordinário a quantidade de gente que é ludibriada, induzida a acreditar que a multiplicação de suas finanças acontecerá do dia para a noite. Acreditam neste milagre financeiro.
Por que será que isso acontece? Apesar de se ter notícias desses golpes? E de constantes alertas a respeito?
A última que se tem notícias [pelo menos até a gravação deste SIC] várias celebridades acreditaram no milagre da multiplicação.
[[[[O Tribunal de Justiça de São Paulo aceitou denúncia do Ministério Público do Estado e tornou réus quatro membros de uma quadrilha que causou prejuízos de R$ 1,4 milhão em golpes da modalidade pirâmide financeira, aplicados contra celebridades e empresários. Entre as vítimas, estão a atriz Juliana Paes e o ex-jogador de futebol Luiz Fabiano.
As vítimas eram convencidas pela quadrilha de que receberiam lucro entre 4% e 8% ao mês;]]]
É assim, desse jeitinho aí oferta de ganhos extraordinários que seduzem muitas pessoas, as quais quando se dão conta além de não realizarem tais lucros, ainda perdem o capital investido.
Há quem diga que se trata de pessoas gananciosas e que de certa forma merecem a realização da perda, já que elas assumiram os riscos.
Quero te dizer que na verdade elas nem analisaram os riscos, provavelmente, foram vítimas dos vieses inconscientes, os quais são responsáveis por diversas de nossas escolhas.
Em finanças comportamentais podemos dizer que a decisão em aplicar seus recursos acreditando em ganhos extraordinários, pode ser fruto do Viés de otimismo e/ou do Efeito de enquadramento.
Vamos a um exemplo:
A respeito do copo meio cheio ou meio vazio, imagine o seguinte:
– Se estou com sede e enquadro o copo como meio cheio, provavelmente a quantidade de água me saciará e ficarei feliz por matar minha sede.
– Se estou com sede e enquadro o copo como meio vazio, provavelmente a quantidade de água será insuficiente para matar minha sede.
Daniel Kahneman e Amos Tversky (DANIEL KANEMAN E EMES TIVISKI )pesquisaram este comportamento, o Efeito Enquadramento (Framing Effect), que significa que as pessoas darão respostas diferentes ao mesmo problema, dependendo de como ele é abordado ou enquadrado. Kahneman e Tverksy publicaram, em 1981, sua pesquisa no artigo The framing of decisions and the psychology of choice (O enquadramento das decisões e a psicologia das escolhas – em tradução livre). Eles dividiram os participantes em dois grupos, e pediram que escolhessem entre dois tratamentos (A ou B) para 600 pessoas infectadas com uma doença mortal.
No Grupo 1, os participantes foram informados que:
Com o Tratamento A, “200 pessoas serão salvas”.
Com o Tratamento B, “há uma probabilidade de um terço de salvar todas as 600 vidas e uma probabilidade de dois terços de não salvar ninguém”.
A maioria dos participantes optou pelo tratamento A.
No Grupo 2, por outro lado, foi dito aos participantes que:
Com o tratamento A, “400 pessoas morrerão”.
Com o tratamento B, “há uma probabilidade de um terço de que ninguém morrerá, e uma probabilidade de dois terços de que 600 pessoas vão morrer”.
Neste grupo, os resultados foram invertidos, a maioria dos participantes optou pelo tratamento B.
Veja que o que propõe o tratamento A e o tratamento B é exatamente a mesma coisa – tudo o que mudou foi o contexto, a abordagem. Quando foi apresentado um enquadramento positivo na primeira opção, os participantes escolheram a primeira opção (tratamento A); quando foi apresentado um enquadramento negativo na primeira opção, eles optaram pela segunda opção (tratamento B).
A Abordagem Positiva, abordar, formular, ou contextualizar uma informação de forma positiva é o gatilho para o efeito enquadramento.
É assim desse jeitinho aí, você é abordado com informações positivas entre as quais a possibilidade de ganhos extraordinários e enquadra sua decisão nestas informações.
E os vieses não atuam somente em finanças, estão em toda a parte, como demonstrado na pesquisa de Kahneman e Tverksy.
Olha um outro exemplo interessante. Reflita: Quando você vê um produto com a informação que tem “zero açúcar”, há a mesma ênfase para a quantidade de adoçantes artificiais que o produto contém? Não, não é mesmo?
Portanto, quando o milagre for demais, desconfie, abra bem os olhos para as letrinhas miúdas.
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